"Estou sendo julgado por Power Point mentiroso", diz Lula a Moro; Assista na íntegra
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva negou nesta quarta-feira (10) ser o verdadeiro dono do tríplex do Guarujá, em depoimento ao juiz Sergio Moro. O petista afirmou ainda que nunca se interessou pela compra do apartamento. "Eu só poderia utilizar aquele apartamento numa Quarta-feira de Cinzas com chuvas", disse Lula, de acordo com que o UOL apurou junto a pessoas que acompanharam o depoimento.
O ex-presidente começou as alegações finais a Moro relembrando sua eleição, e dizendo que "não tinha o direito de errar" enquanto era presidente. Em meio a esta memória da primeira eleição de Lula, o juiz Sergio Moro interrompeu a fala e pediu para ele ser mais breve, e que ali não caberia uma memória do governo inteiro. No que Lula argumentou que estava sendo julgado por atos durante o governo, e que não tinha como defender-se sem falar da gestão.
"Eu sou julgado pela construção de um PowerPoint mentiroso, aquilo é ilação pura", disse Lula a Moro.
"Eu tenho 71 anos de idade, cinco filhos e oito netos, e nunca ninguém que me acusou respeitou meus netos, que sofrem bullying todo dia por causa de mentira", continuou o ex-presidente. E reclamou do tratamento dado ao assunto pela imprensa. "De março para cá, são 29 capas da revista 'Isto É', 19 da 'Veja' e 11 da 'Época' demonizando o Lula", afirmou, reclamando dos vazamentos seletivos.
Durante quase cinco horas, o ex-presidente prestou depoimento, na condição de réu, em uma ação penal na 13ª Vara Federal de Curitiba, sob a acusação de ter recebido propina da OAS, no âmbito do esquema de corrupção em contratos da Petrobras. Segundo a denúncia, Lula teria recebido da empreiteira um tríplex no Guarujá (SP), além do pagamento do armazenamento de bens recebidos durante sua passagem pela Presidência da República (2003-2010).
Lula deixa sede da Justiça Federal após depor a Moro
"É ilação pura. Aquilo deve ter sido feito, com todo respeito, por alguém que desconhecendo a política, fizeram o Power Point porque já havia tese anterior de que o PT era uma organização criminosa, que Lula era chefe que montou um governo para roubar. É uma tese eminemente política", disse o petista, em referência a entrevista coletiva de procuradores da Lava Jato em que foi exibida uma apresentação em Power Point. Na ocasião, Lula foi apontado como "comandante máximo" do esquema do petrolão.
"Porque esse é o problema da mentira, depois você não tem como voltar atrás. Então, eu queria só pedir a meus acusadores que levem em conta que vocês são muito jovens, que vocês têm muito tempo pela frente. O Ministério Público, que é uma instituição que ninguém respeita como eu respeito, não foi feita pra isso. A acusação tem que ser séria, tem que ser fundamentada, ela não pode ser especulativa", declarou Lula, segundo apurou a reportagem.
"Respeito"
Lula fez queixas sobre a atuação da imprensa a Moro, que, por sua vez, disse a ele que o ex-presidente foi tratado "com respeito" durante o processo. "Senhor ex-presidente, (...) a imprensa não tem qualquer papel no julgamento desse processo. O processo vai ser julgado com base na lei (...). O senhor foi tratado com o máximo respeito", declarou o juiz da Lava Jato, que foi alvo de muitas críticas da defesa do petista.
"Eu esperava que houvesse mais respeito por um homem que deu a este país a dignidade que ele não tinha há muito tempo: dignidade do Ministério Público, da Polícia Federal e outras entidades", disse o petista ao juiz.
"Respeitei as leis como nenhum presidente respeitou", voltou a dizer Lula durante o depoimento.
Lula falou a Moro por cerca de 20 minutos na sua alegação final, nos quais foi interrompido pelo juiz com perguntas algumas vezes.
Primeiro, Moro abriu os trabalhos e fez os questionamentos ao réu no processo sobre o tríplex que Lula teria recebido da empreiteira OAS como propina em troca de contratos na Petrobras e sobre a ajuda da empresa na manutenção de parte do acervo presidencial de Lula.
Depois, foi a vez de o MPF (Ministério Público Federal) manifestar-se e fazer perguntas. Após a acusação, foi a vez dos advogados dos réus – além de Lula, há mais cinco denunciados no caso. Por fim, falou o ex-presidente Lula.
"Eu tenho orgulho da Petrobras", alegou Lula ao expor o crescimento da empresa durante sua gestão. "Se alguém roubou na Petrobras, que pague", disse ao abordar o assunto.
Eu dizia para mim todo santo dia quando fui eleito que não tinha o direito de errar, pq se eu errasse a classe trabalhadora nunca mais ia eleger alguém do andar debaixo. "Pelo amor de Deus, apresentem uma prova, chega de diz que diz", afirmou sobre as acusações contra ele.
"Só poderia utilizar aquele apartamento tríplex em uma quarta-feira de cinzas com chuva", disse sobre o imóvel. Moro reclamou que Lula estaria desviando muito do assunto, no que Lula retrucou: "Estou falando em dois minutos sobre o que me acusam há dois anos". "Eu vou lhe dizer uma coisa, para ficar com a minha consciência leve: O comprometimento da Justiça e da acusação com a imprensa está levando a um impasse", disse o ex-presidente, ao dizer que agora o supusto conluio não sabe mais como voltar atrás. "A acusação tem que ser séria, fundamentada, não pode ser expeculativa", disse Lula a Moro, reclamando do trabalho do MPF. "Sou um cidadão subordinado à Lei, à Justiça e aos cidadãos. Vim aqui sem nenhum rancor". "A imprensa não tem qualquer relação com esse julgamento, aqui é tudo baseado na lei", respondeu Moro a Lula depois das alegações do ex-presidente. "O julgamento será feito com base exclusivamente nas provas do processo", afirmou o juiz, dizendo que o que foi publicado pela imprensa não tem relação com o andamento do processo. "Eu queria lhe avisar uma coisa: esses mesmos que me atacam hoje, se tiverem sinais de que serei absolvido, prepara-se: os ataques ao senhor vão ser muito fortes", respondeu Lula a Moro em tom de advertência. "Eu já sou muito atacado", afirmou Moro, e repetiu que o julgamento será técnico.
Moro perguntou sobre mensalão
Em reservado, um advogado que presenciou o interrogatório afirmou que Lula respondeu todas as perguntas de Moro, parando apenas quando o juiz "desviou do processo" ao questioná-lo sobre o esquema conhecido como mensalão. O ex-presidente foi orientado por sua defesa a não responder.
Ainda de acordo com o advogado, Moro não fez nenhuma pergunta sobre o acervo presidencial.
"Moro iniciou nervoso. Seguiu uma lista longuíssima de perguntas e não desviou delas. Os advogados pediram para ele adaptar as respostas pois muitas [Lula] já havia respondido e ele seguiu por quatro horas perguntando", acrescentou.
O ex-presidente respondeu, segundo o advogado, todas as perguntas do Ministério Público, e falou sobre a agenda do Instituto Lula.
Sobre o elevador que seria construído no apartamento, Lula disse, ainda de acordo com o advogado, que mora em um apartamento com uma escada caracol e que "seria insano" ele pedir um elevador em um imóvel "que não é dele" e deixar o imóvel que vive há mais de 20 anos.
Entenda o caso do tríplex
O valor total da vantagem indevida seria de R$ 3,7 milhões, como contrapartida por três contratos entre a OAS e a Petrobras, segundo o MPF (Ministério Público Federal).
Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, disse no último dia 20 de março, em depoimento ao juiz Sergio Moro que o apartamento tríplex no edifício Solaris pertence ao ex-presidente.
"O apartamento era do presidente Lula. Desde o dia em que me passaram para estudar os empreendimentos da Bancoop, já foi me dito que era do presidente Lula e sua família", respondeu o ex-presidente da OAS.
A OAS assumiu empreendimentos que a Bancoop não concluiu por dificuldades financeiras, entre eles o Solaris. A Bancoop era uma cooperativa habitacional de bancários de São Paulo, fundada na década de 1990 por petistas como Ricardo Berzoini, ex-presidente do partido.
Segundo Pinheiro, o imóvel no Guarujá nunca foi colocado à venda por estar reservado para a família de Lula.
"Nunca [o tríplex] foi colocado à venda pela OAS. Eu tinha a orientação para não colocar à venda, que pertenceria à família do presidente. Em 2009, foi dito pra mim: Essa unidade, não faça nenhuma comercialização sobre ela, ela pertence a família do presidente."
A denúncia do MPF (Ministério Público Federal) acusa Lula de ser o real dono de um apartamento tríplex no edifício Solaris, no Guarujá (SP), construído pela OAS e do qual a empresa é dona no papel.
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