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New York Times

30 anos após acidente, exclusão de Tchernóbil é rompida pelo desmatamento ilegal


Com o acidente, a usina liberou uma quantidade letal de material radioativo que contaminou uma quilométrica região atmosférica. Para tentar deter a liberação de radiação, foi construída uma enorme cobertura de concreto em torno da unidade do reator nuclear 4 (visível na foto). No total, o desastre emitiu cem vezes mais radiação que as bombas jogadas contra as cidades japonesas de Hiroshima e Nagasaki, no fim da Segunda Guerra Mundial

A estrada pela floresta, abandonada, às vezes mal pode ser vista, coberta por galhos de árvores, trepadeiras, folhas e musgo brotando pelas rachaduras no asfalto que está se desfazendo.

É melhor evitar o musgo, diz nosso guia, Artur N. Kalmykov, um jovem ucraniano que tem como hobby visitar a zona de exclusão que cerca o reator nuclear de Tchernóbil, isolado para sempre depois da catástrofe de 1986. O musgo pode ser radioativo, ao trazer radiação enterrada para superfície à medida que cresce.

Acima de tudo, ele diz, é preciso ter cuidado com a poeira soprada pelo vento, que também pode estar envolta em plutônio mortífero.

O que Kalmykov e outros exploradores não oficiais da zona de Tchernóbil, membros de uma subcultura peculiar que têm na faixa de 20 anos e que chamam a si mesmos de "stalkers" (pessoa que persegue ou vigia sorrateiramente), encontraram é ainda mais interessante: vastas áreas de desmatamento em uma floresta ostensivamente protegida.

Kalmykov, um programador de computadores que descobriu as áreas desmatadas enquanto explorava a zona em seus fins de semana, levou suas descobertas ao Impeça a Corrupção, um dos grupos da sociedade civil que surgiram na Ucrânia após a revolução da Praça Maidan há dois anos, evento que deveria levar a uma nova era de governo honesto na Ucrânia.

Mas na área de terras mais sujas da Ucrânia, diz o Impeça a Corrupção com base nas evidências dos "stalkers", os negócios escusos dos burocratas que administram a área estão florescendo como sempre. Distraída pelo 30º aniversário da catástrofe em 26 de abril e pela turbulência geral na Ucrânia, diz o grupo, a Agência de Gestão da Zona de Exclusão está fazendo vista grossa para a extração de madeira em Tchernóbil.

A Zona de Alienação, como também é conhecida, é um quase círculo de 29 quilômetros de raio cercado por arame farpado. O acesso é rigidamente controlado, de modo que as delegações e visitas com guias geralmente percorrem as poucas rotas fixas. Fora dessas áreas frequentadas por turistas, disse a Impeça a Corrupção, sob o disfarce de remoção das árvores mortas por incêndios florestais, pinheiros saudáveis estão sendo derrubados em grande número para venda na Ucrânia e Romênia, de onde a madeira pode ser revendida por toda a Europa.

"Achávamos que esses incidentes eram isolados e sem importância, mas quando começamos a investigar, revelou ser um problema gigante e sistêmico", disse Vadim Vnukov, o principal advogado do grupo.

A madeira extraída de Tchernóbil, apesar de não exatamente brilhar no escuro, ofereceria riscos a alguém vivendo em uma casa feita dela, disse Vnukov.

"Há um risco claro à saúde aqui", ele disse. "Nós encontramos um sistema que opera ao longo de décadas, e qualquer que fosse o governo, esse sistema de corrupção foi preservado."

Hoje, dizem os cientistas, o nível médio de radiação prejudicial à saúde humana na zona é cerca de um quarto do que era logo após a explosão e incêndio. Uma leitura típica na zona é de cerca de 100 microsieverts, ou comparável à exposição que um avião de passageiros receberia em um voo transatlântico.

Mas ainda há riscos nocivos. Colocado perto do musgo, por exemplo, um contador Geiger zumbiu como um barbeador elétrico.

"Não é tão perigoso quanto parece", disse Kalmykov dando de ombros. "Algumas pessoas são simplesmente radiofóbicas."

Em uma entrevista em seu gabinete em Kiev, Vitalii Petruk, o chefe da Agência de Gestão da Zona de Exclusão, negou que tenha ocorrido extração ilegal de madeira desde que assumiu o cargo em setembro. Mas desde a revolução, ele é o quinto diretor da zona, que assim como o restante da Ucrânia, passa por um momento de instabilidade.

Os madeireiros cortam as árvores queimadas após incêndios florestais, para evitar surtos de pragas, e abrem aceiros e rotas para os cabos elétricos, ele disse. Desde 2004, é legal na Ucrânia a venda de madeira da zona caso ela passe pelos controles radiológicos.

Petruk não tem vergonha em defender uma maior atividade comercial na zona, incluindo a exploração de madeira.

"Como transformarmos nossa vergonha em uma vantagem?" ele disse. Sua resposta é "Zona de Mudança", uma proposta por sua agência para aumento da extração de madeira para alimentar uma usina elétrica a lenha, feita de resíduos de madeira locais, que ele apontou que reduziria a dependência de gás natural russo.

O conceito de zona de exclusão, um experimento importante para o setor nuclear, era limitar, por meio do isolamento, a letalidade de um acidente na usina nuclear. (Menos de 200 pessoas permaneceram aqui depois da retirada de mais de 100 mil.) Os elementos radioativos degradam em intervalos previsíveis chamados de meia vida, que podem variar enormemente. As partículas presentes no solo durante sua meia vida não fazem mal a ninguém; a meia vida média de uma partícula em Tchernóbil é de cerca de 30 anos.

Mas a extração de madeira em uma floresta pós-apocalíptica ofereceria várias preocupações de saúde. As árvores, assim como o musgo, absorvem radiação do subsolo. Além disso, o corte movimenta o solo, misturando serragem radioativa e acelerando a erosão.

Em certo ponto ao longo da estrada, a floresta se abre para uma área desmatada de vários hectares, cortando bosques saudáveis de pinheiros, apesar de próximo de uma área queimada. "Veja, eles não tocaram nas árvores queimadas", disse Kalmykov, apontando para os pinheiros enegrecidos ainda em pé.

"Durante a mudança do governo, ninguém estava prestando atenção e as pessoas não perderam a oportunidade" de ganhar algum dinheiro, ele disse sobre os madeireiros. "Todos sabem. As pessoas necessárias recebem o dinheiro necessário."

Um madeireiro, com o rosto suado repleto de poeira e serragem, disse que apenas corta as árvores marcadas por seus chefes na gestão da zona de exclusão. "Não sou eu quem decide", disse o homem, que se recusou a dizer seu nome. "Eles dizem que não precisamos dos troncos queimados."

Ao ser perguntado se ele se preocupava com a radiação, ele disse que não, que a esta altura a radiação já desceu para as profundezas do solo.

"Nós a prensamos para que não saia", ele disse, batendo no solo com sua bota. "Quer comprar madeira?"

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